Oriente Médio: razões para otimismo?

Eventos ocorridos no Oriente Médio nestes últimos dias têm levado alguns analistas a visualizar um período de distensão, quem sabe levando à efetivação dos eternos e inconclusos “processos de paz”.
A primeira notícia diz respeito ao acordo firmado no Qatar, na quarta-feira (21/5), entre os líderes das diversas facções libanesas, encerrando um impasse político que já se estendia por 18 meses – e que há duas semanas se transformou num conflito armado, curto, mas intenso, que levou todos a temer uma nova guerra civil no país, e que revelou um novo balanço de poder, com as forças do Hizbollah mostrando-se superiores mesmo às do Governo. Isto se refletiu no acordo de Doha, por meio do qual se decidiu pela eleição (no Parlamento) de um novo presidente (o que deve ocorrer neste domingo, 25), a formação de um governo de união em que a oposição liderada pelo Hizbollah terá 11 ministros (de um total de 27) e o poder de veto. Além disso, não se discutiu o desarmamento da milícia xiita, embora tenha sido aprovado um ponto proibindo a utilização de violência na disputa política.
Outra notícia bastante celebrada nos últimos dias foi a revelação de que Israel e Síria estão participando de negociações indiretas, negociadas pela Turquia, visando o estabelecimento de um acordo de paz. Para os mais otimistas, um acordo entre estes países retiraria a Síria da “Aliança Iraniana”, que engloba ainda o Hizbollah, no Líbano, e o Hamas, na Palestina, e abriria caminho para um acordo de paz também com os palestinos e com o Líbano, isolando o ameaçador Irã.
Os eventos no Líbano e no Qatar, assim como a notícia das negociações Sírio-israelenses, geraram algumas análises otimistas – como meu próprio artigo de 13/5, “Uma oportunidade para o Líbano”. Especificamente no que se refere a este país, mantenho minha opinião de 10 dias atrás após o desfecho das negociações em Doha, acreditando que o espectro de uma guerra civil tenha levado os grupos antagonistas libaneses a buscar uma solução negociada – embora a demonstração de força do Hizbollah do início de maio tenha levado este grupo a obter concessões por parte da maioria sunita no governo. Resta verificar o resultado das prometidas eleições parlamentares, e se este aumento do poder relativo do Hizbollah se traduzirá no aumento de cadeiras no Parlamento, permitindo-lhes formar o governo – o que inevitavelmente levaria a novos e imprevisíveis eventos.
Quanto às negociações sírio-israelenses, pouco motivo há para otimismo. Outras negociações informais ou indiretas já ocorreram em outros momentos, porém nunca houve a real intenção, por parte do governo israelense, de desocupar as Colinas de Golã, tomadas à Síria em 1967. O partido Likud, de onde saiu o primeiro-ministro Olmert (atualmente no Kadima), e que deve voltar ao poder com o falcão Benjamin Netanyahu, adotou em junho de 2007 uma resolução que define as Colinas de Golã como "parte inseparável" de Israel. Além disso, naquela região já se encontram cerca de 20.000 colonos judeus, pouco propensos a aceitar o deslocamento para outras regiões (lembre-se da dificuldade que Israel teve para retirar os 8.500 colonos da Faixa de Gaza, em 2005). Por fim, o território é contemplado com as nascentes do Rio Jordão, que garantem a Israel o controle deste manancial.
A revelação destas “negociações de paz”, aparentemente, destina-se mais a distrair a atenção do público interno israelense das recentes denúncias contra o primeiro-ministro Ehud Olmert, acusado de receber vultosas propinas de um empresário estadunidense. Outro objetivo poderia ser criar uma dissensão interna na Aliança Iraniana com a mera menção às negociações sírio-israelenses.
Adotando a tese otimista, e supondo serem reais as negociações, sabe-se que pelos motivos apontados acima, estas estão fadadas ao fracasso. Por fim, num esforço extremo de otimismo, e supondo a conclusão de negociações entre Israel e Síria, resta apenas destacar que isto não levaria a Síria a abandonar sua aliança com o Irã, e o apoio aos grupos de resistência anti-israelenses no Líbano e na Palestina. O Oriente Médio só terá paz quando Israel devolver integralmente as terras ocupadas em 1967 e 1982, permitindo seu reconhecimento por parte da comunidade internacional como um Estado que respeita a lei. Enquanto permanecerem as violações do direito internacional e as violações dos direitos humanos de palestinos, sírios e libaneses, se manterá a resistência e o estado de beligerância entre Israel e seus vizinhos árabes e xiitas.

4 comentários:

Anônimo disse...

Acho que realmente a única razão para otimismo seria a concretização de um governo de coalizão no Líbano, reduzindo tensões internas e a probabilidade de guerra civil. Entretanto, me parece muito provável que a participação mais “atuante” de grupos extremistas no governo libanês levará a novos conflitos armados contra Israel, ou seja, mais guerra, morte e destruição. As negociações entre Síria e Israel intermediadas pela Turquia devem ser pura lenda, pois, exceto as Colinas, não me parece factível que Israel tenha outra moeda de troca suficientemente compensadora para que a Síria arrisque qualquer tipo de indisposição com o Irã.
Concordo INTEGRALMENTE que a paz está condicionada a uma revisão da postura de Israel. Mas sou pragmático: neste jogo de forças, os únicos com potencial para “persuadir” Israel são os Estados Unidos e o Irã. Enquanto os dois estiverem em posições antagônicas no tabuleiro, é difícil acreditar em paz e justiça territorial no Oriente Médio. Israel não acatará as resoluções da ONU e não devolverá os territórios ocupados em 67 e 82 enquanto tiver o respaldo do Tio Sam para encobrir seus erros e protegê-lo do Darth Irã, único adversário capaz de fazê-lo “tremer na base”. Pode ser uma falta de visão estratégica da minha parte, mas não consigo enxergar caminhos alternativos ou cartas nas mangas de Síria, Líbano e Palestina com força demovedora. É triste admitir, mas, se potências importantes (Europa e China) continuarem coniventes, a paz estará nas mãos de Obamas, Hillaries ou McCains.
Ah, e é claro, enquanto a mídia for parcialíssima, as massas do mundo inteiro acreditarão que os Estados Unidos e Israel são anjos civilizados e que os árabes não passam de bárbaros endemoniados. Na semana de aniversário de Israel, dentre os programas especiais veiculados na TV sobre esse tema (só a Globo fez dois), pelo menos um poderia ter mostrado as verdades ocultas... que tal: “Israel 60 anos: de admirável a execrável em 60 minutos”.
Outra pergunta que não quer calar: cadê o pessoal dos direitos humanos? Às vezes eles me parecem bem seletivos em suas causas...
Desculpe pelo comentário tão extenso!
Christian R.

Anônimo disse...

Esta semana tem revelado notícias cheias de esperança rumo a paz tão desejada. O simples fato da existência de reuniões oficiais e de declarações de um cessar fogo na faixa de Gaza com o Hamas e da devolução de parte das Colinas do Golan para a Síria abrem oportunidades singulares rumo ao entendimento de uma Paz Fria. Acordos destes níveis implicam num exercício de tolerância para ambos os lados. Segunda dia 2 de junho foi comemorado o Jerusalem Day. Shalom. Jacob. 1 Sivan 5768

Anônimo disse...

A questão estrutural deste conflito rende-se a desobediência por parte dos árabes da determinação contida na Resolução 242 do Conselho de Segurança que diz: "[O Conselho de Segurança](1) Afirma que o cumprimento dos princípios estatutários requer o estabeleciemnto de uma paz justa e duradoura no Oriente Médio, que deveria incluir a aplicação de AMBOS os princípios seguintes: (1) Retirada das forças armadas de Israel DE territórios ocupados no recente conflito; (2) Fim de todas as reivindicações ou estados de beligerância e reconhecimento da soberania, integridade territorial e independência política de cada Estado na área e seu direito de viver em paz dentro de fronteiras seguras e reconhecidas, livre de ameaças ou atos de força." Vejam que a resolução determina DE Territórios e não de TODOS os Territórios, além do mais a paz foi conquistada com a respectiva devolução de territórios (pela primeira vez na história esta determinação de devolução de territótios conquistados numa guerra defensiva foi efetuada)a países que se comprometeram ao acordo de paz: Egito e Jordânia, pois Síria e os árabes-palestinos recusaram o reconhecimento de Israel e a paz.O bloqueio ao estreito de Tiran estrangulando o fluxo comercial através do Mar Vermelho revelou a intenção de um ataque em seguida por parte dos árabes. O serviço de informação israelense agiu com rapidez e o desfecho foi a vitória em seis dias. 3 Sivan 5768.
Shalom.

Anônimo disse...

Sr. Jacob C.
Achei pitoresca a nuance interpretativa para a preposição "DE" em seu comentário. O pensamento que me ocorreu inevitavelmente foi o seguinte: Será que os judeus se sentiriam confortados, ou menos lesados, se após o holocausto Hitler se defendesse dizendo que pregou a matança DE judeus e não DE TODOS os judeus?
É uma pena que a grande maioria dos judeus não faça uma reflexão sobre o sentido da palavra paz antes de encher a boca para dizer SHALOM.